segunda-feira, 14 de maio de 2012

Onde a habilidade não teve vez. Amém.

         Com ele as coisas parecem que sempre foram assim, no limite, na divisa. Posso imaginar os comentários dos olheiros quando, lá em 1991, no Piacenza, um rapaz fransino e de canelas finas se apresentou como postulante a vaga de atacante do time. Não deve ter sido muito intimidadora  a sua presença na área desde o começo de sua carreira, mas isso pouco importa agora. Depois de mais de 10 anos de alegria, gritos, taças e choros, ele se vai.
          Nunca foi dos mais habilidosos. Posso imaginar a conversa das bolas de futebol, quando juntas para o início do treino, quase implorando que ele não tocasse nelas por mais de três vezes em uma jogada. E na bem da verdade ele nunca precisou de mais de 3 toques nela para fazer o que sempre foi destinado a fazer. E, como sempre, ele caminhava no limite. No limite entre a grossura completa, a total falta de trato e classe, que muitos tinham, e aquela única e específica técnica que ele dominava tão bem: a finalização. Ele nunca, mesmo, precisou de habilidade, ginga, dribles desconcertantes. Tudo que importava era o simples. E ele simplesmente dominava. E fazia chorar.
         O incontrolável, e inssaciável, instinto de predador em campo era sua guia, sua bússola. De costas para a meta, de frente para a bola. Passava mais tempo a seguindo com os olhos do que intimidando seus marcadores e os defensores adversários com seu porte físico ou careta. E, como sempre no limite, sempre era pego em posição desconcertante, desfavorável para o destino final que havia imaginado para aquela bola, para toda a jogada. Inúmeras vezes por jogo, incontáveis por temporadas em que jogou. Todavia, a linha ele uma hora achava, e como todo bom caçador, só precisava de uma chance. E aqui jaz sua linha de impedimento, sua defesa e seu goleiro, batido e abatido sem piedade.
          Muito mais do que seus gols, o mundo nunca esquecerá sua comemoração. Eram de enlouquecer os mais racionais torcedores. E de trazer para seu lado mesmo os torcedores adversários. Um misto de emoção e desabafo que era posto para fora com muita paixão. Pela paixão que só os que realmente sabem o prazer e a felicidade que trazem a milhões de desconhecidos um momento como aquele, alguém que sabe que suas lágrimas de alegria também enchem os olhos de tantos outros, e aquecem o coração de todos. No limite novamente, entre o êxtase e a loucura, ele fazia muitos chorarem. De amor ou de ódio.
        Como não poderia deixar de ser, o momento do adeus foi o mais doloroso de todos. Mas o destino guarda tanta felicidade para quem mostra paixão no que faz que reservou uma última emoção, um último grito de alegria para todos que tanto esperavam. E não poderia ser diferente. Novamente o instinto, a linha defensiva sob controle, entrada triunfante entre os defensores adversários, um toque de classe do velho maestro e com exatos 3 toques na bola (para alívio dela), o caçador de 38 anos mostrou ao mundo qualidades únicas, exclusivas. O senso de colocação, de força e, principalmente, a finalização perfeita. E mais uma vez ele chorou. Assim como eu também.
       Muito obrigado, SuperPippo Inzaghi. Por me fazer chorar pela primeira vez ao ver um jogo de futebol. Por me fazer apaixonar por um time, por um camisa, pelas suas comemorações extasiadas. Você é o Deus-Caneleiro por qual sempre farei oferendas e juramentos.

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